Bernita Miguel, 52

Taurepang

Bernita Miguel, da etnia Taurepang, foi uma importante liderança indígena entre os Macuxi, faleceu no dia 21 de maio de 2020, na cidade de Boa Vista (RR). Bernita, tinha 52 anos. Professora de língua Macuxi na Escola Estadual Indígena Artur Pinto, nas comunidades de Nova Esperança e Alto São Marcos/Terra Indígena São Marcos (Pacaraima/RR), também cursava Licenciatura Intercultural no Instituto Insikiran da Universidade Federal de Roraima.

Ineide Messias, sua amiga, assim se manifestou no Facebook: “Ainda sem acreditar, sentindo uma enorme dor! Mas com muita gratidão pela pessoa que foi comigo. Tinha uma atenção muito especial só para eu me sentir bem. Você foi uma pessoa muito especial. Uma pessoa que contribuiu muito conosco no curso do Magistério Indígena. Obrigada, obrigada, por tudo. Você virou uma estrela junto às sete estrelas do Tamîkan. Sempre estará nos nossos corações, Bernita Miguel. Descanse em paz!”.

FONTES 

Foto em Destaque: Enviada por Beatriz Miguel, irmã de D.Bernita.

Foto da Galeria: Enviada por Beatriz Miguel, irmã de D.Bernita.

Luiz Carlos Rodrigues Curico, 44

Kokama

Luiz Carlos Rodrigues Curico, do povo Kokama, faleceu aos 44 anos no dia 23 de maio de 2020, no hospital de guarnição de Tabatinga, no estado do Amazonas. Ele era acadêmico do penúltimo período do curso superior de Formação de Professores Indígenas da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Amazonas, Turma Alto Solimões, no município de Benjamim Constant. Carlos Curico atuava como professor na Terra Indígena Sapotal, e vivia na cidade de Tabatinga.

Segundo informações do Instituto Socioambiental (ISA), os Kokama habitam o rio Solimões, espalhados na região da tríplice fronteira Brasil-Peru-Colômbia, em cada um dos três países. Falam uma língua do Tronco Tupi, da família Tupi-Guarani. O contato dos Kokama com a sociedade não-indígena remonta às primeiras décadas de colonização espanhola e portuguesa, no início do século XVI. Os aldeamentos e deslocamentos forçados, impostos primeiramente pelas missões católicas e depois pelas frentes extrativistas, acabaram criando um contexto tão adverso para a existência física e cultural desse povo que acarretou a sua negação da identidade indígena por muitas décadas. Desde os anos de 1980, porém, a identidade indígena Kokama vem sendo cada vez mais valorizada no contexto de suas lutas políticas – que incluem outros povos indígenas do Solimões – por terras e acesso a programas diferenciados de saúde, educação e alternativas econômicas.

Fontes

Foto de Destaque: Autorizada por Antônio Filho (irmão de Luiz Carlos Curico)

Fotos da Galeria: Autorizada por Antônio Filho (irmão de Luiz Carlos Curico)

Instituto Socio-Ambiental (ISA)
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Kokama#Fontes_de_informa.C3.A7.C3.A3o

Universidade Federal do Amazonas (UFAM)
https://ufam.edu.br/ultimas-noticias/1458-nota-de-pesar-discente-formacao-de-professores-indigenas-luiz-carlos-curico-kokam.html 

ESCUELA IKUARI – KUMBARIKIRA
https://youtu.be/JxovOS7ueP0

 

Feliciano Lana, 83

Desana

Soubemos pelo site do Instituto Socioambiental (ISA) que Feliciano Pimentel Lana faleceu no dia 12 de maio de 2020, em São Francisco, comunidade indígena situada no Alto Rio Negro. Aos 83 anos, o artista plástico do povo Desana, de estilo inconfundível, deixa uma extensa produção que se espalhou por muitas publicações e acervos de instituições nacionais e internacionais, tornando-se uma marca do Rio Negro indígena. Ele era um artista expedito e versátil que expressava conhecimentos minuciosos das narrativas míticas, da história e das paisagens do noroeste amazônico em seus desenhos e pinturas.

 

Feliciano nasceu na comunidade desana São João, no Médio Rio Tiquié, tendo recebido o nome de benzimento de Sibó, “filho do sol”. Outro artista indígena, Denilson Baniwa, assim disse sobre Sibó: “O mundo perde hoje um dos maiores artistas indígenas da contemporaneidade. Uma biblioteca humana, grande artista, amigo, irmão e exemplo para muitos jovens indígenas. Uma profunda dor por cada mestre que perdemos. Nós ficaremos com a lembrança dos ensinamentos e das risadas alimentadas durante sua passagem por este planeta. É preciso que ajudemos ainda mais a proteger as populações indígenas desta doença Covid-19”.

 

FONTES

Foto em Destaque: Juliana Radler (via ISA-Socioambiental)
Fotos da Galeria: Reprodução//Amazônia Real (Ilustração 1); Tatiana Cardeal (via Amazônia Real); Amazônia Real (Ilustração 2); Amazônia Real (Ilustração 3); ISA-SocioAmbiental (Ilustração 4); Thiago Oliveira (via Amazônia Real); Juliana Radler (via ISA-Socioambiental). 

Instituto Socioambiental (ISA)
https://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-socioambientais/rio-negro-perde-seu-feliz

Amazônia Real
https://amazoniareal.com.br/o-lider-do-povo-desana-feliciano-lana-morre-em-sua-casa-no-alto-rio-negro/

Antonio Bolívar, 76

Ocaina

O ator colombiano Antonio Bolívar faleceu vítima da Covid-19 aos 76 anos de idade, no dia 01 de maio de 2020, na cidade de Letícia, Colômbia, fronteira com Brasil e Peru. Ele nasceu na região colombiana de La Chorrera, banhada pelo rio Putumayo, habitada por povos indígenas de língua uitoto que foram assolados durante o ciclo extrativista da borracha nas primeiras décadas do século XX. Antonio ficou conhecido mundialmente através do filme “O Abraço da Serpente”, indicado ao Oscar em 2016 na categoria Melhor Filme Estrangeiro.

Em “O Abraço da Serpente” Antonio Bolívar interpretou Karamatake, último sobrevivente do povo Ocaina e encarregado de guiar o etnobotânico Richard Evans pela selva em busca da yakruna, planta sagrada que lhe daria a capacidade de sonhar: um personagem que representa a sabedoria e os conhecimentos ancestrais indígenas.

Antonio Bolívar frequentou a escola de comunicação indígena em Letícia como estudante e como ancião tradicional; em 2019 formou-se comunicador indígena comunitário.  

 

Texto* del homenaje enviado por el antropólogo e investigador Nicolas Victorino del Grupo de Estudios Transfronterizos (GET)Leticia, no dia 1 de Mayo de 2020.


La noche del 30 de Abril de este año 2020 falleció el abuelo Antonio Bolívar. Don Antonio, indígena de Pueblo Ocaina tenía 75 años y era descendiente de los pueblos de la región de La Chorrera, lugar de su nacimiento, en el interfluvio Putumayo – Caquetá, departamento de Amazonas, Colombia. Esta región es recordada por el proceso de resistencia histórica que movilizo a la totalidad de población indígena frente a la cauchería a inicios del siglo XX,  especialmente por los violentos hechos sucedidos en la Casa Arana, fundada en la misma Chorrera durante el periodo de explotación del caucho, y de la cual los pueblos indígenas Ocaina, Murui, Bora, Miraña, Andoque fueron directamente victimizados.

A Don Bolívar lo conocí en el año de 2005, en la maloca de los curanderos William e Isabel  en la comunidad Jittoma en la vía Leticia – Tarapacá. El hacía parte de los mayores tradicionales que mantienen un sistema de relaciones entre malocas de distintos pueblos indígenas que han migrado hacia las cercanías de Leticia, durante los últimos cincuenta años por distintas causas, destacándose los efectos del conflicto armado colombiano, y se han constituido  en el resguardo indígena Ticuna – Uitoto, en el municipio de Leticia.

Don Antonio fue mundialmente conocido, durante los últimos años, por su papel de “Karamatake”  protagonista en la película “el Abrazo de la Serpiente”, la cual fue nominada al premio Oscar en el año 2016 en la categoría de mejor película extranjera.  El éxito obtenido por la película y particularmente  don Antonio como actor, se consolido posteriormente, cuando volvería a actuar en la mini serie de televisión  “Frontera Verde”  producida por Ciro Guerra (Director también del famoso filme)  para la multinacional de entretenimiento Netflix. Actualmente era miembro de la Escuela Indígena de Comunicaciones de la Amazonía Ka+ Jana Uai y participaba en otros proyectos culturales indígenas del municipio.

La visibilidad como figura  icónica  de “ultimo chaman” o “guardián de selva “que logró el personaje interpretado por don Antonio, en gran parte promovida por un exotismo comercial generado por los medios masivos de comunicación,  contrastaba con la tranquilidad de un hombre de conocimiento, heredero de luchas indígenas y con la fuerza alegre de humanidad que emitía su presencia en distintos escenarios locales en los que habitualmente era invitado debido esa figura de icono indígena.

A pesar de que don Antonio no estuvo vinculado directamente a los procesos organizativos indígenas, si se manifestaba continuamente exigiendo el mejoramiento de las condiciones básicas de vida de los pueblos indígenas que viven en las actuales ciudades amazónicas como Leticia.

En el año 2018 había sufrido un accidente por caer de una palma al recolectar frutos de asai, lo que había  deteriorado su salud. El año pasado, compartí con él por última vez en la calles de Leticia, junto con Don Antonio, participamos de las masivas movilizaciones y marchas que a nivel nacional se realizaron en el mes de octubre de 2019, contra las nefastas políticas sociales del actual gobierno colombiano. Ese día nos despedimos con una voz de lucha y esperanza colectiva, junto a estudiantes y trabajadores del sector público en el parque Santander frente a la Gobernación del Amazonas, en el centro de Leticia.

Hoy, primero de mayo, el testimonio, en radio local, de su compañera Celia, no confirmaba que la muerte de Don Antonio hubiera sido a causa de infección por el virus covid19. Según Celia, el abuelo Antonio tenía síntomas de neumonía, la cual persistía en él durante el último año, por lo que había sido internado en el hospital de Leticia, donde finalmente murió, y aunque los médicos dictaminaron que su muerte fue a causa del virus Covid 19,  la escasez de pruebas disponibles no permitieron confirmar su infección. Esto es reflejo del difícil panorama que se presentará durante los siguientes días y semanas, en el cual los principales afectados serán los pueblos indígenas.

Descanso y honra para el abuelo Ocaina Antonio Bolívar.

(Leticia, mayo 1 de 2020.)

*Colaboração: O envio do texto foi através do Pedro Rapozo (Sociologia, NESAM/UEA – Manaus e Tabatinga/AM)

FONTES

Foto em Destaque: Cena do filme “O Abraço da Serpente” (O Globo)

Fotos da Galeria: Entertainment Times; Green Frontier (Film); IMDb; Cinema Tropical; Estrela Latina

Cinema Tropical
https://www.cinematropical.com/cinema-tropical/embrace-of-the-serpent-protagonist-antonio-bolvar-dies-at-75-of-coronavirus

IMDb
https://www.imdb.com/title/tt9641192/mediaviewer/rm1296011265

Estrela Latina
https://estrelalatina.com.br/aos-75-anos-morre-por-coronavirus-antonio-bolivar-ator-de-o-abraco-da-serpente-filme-indicado-ao-oscar/

Entertainment Times
https://timesofindia.indiatimes.com/entertainment/english/hollywood/news/covid-19-antonio-bolivar-best-known-for-embrace-of-the-serpent-dies-aged-72/articleshow/75576765.cms

Jader Paes (Pinterest)
https://br.pinterest.com/pin/73253931428047048/

Servícios en Comuicación intercultural (SERVINDI)
https://url.gratis/0u7Wx

Entrevista com Antonio Bolívar (vídeo)
http://youtube.com/watch?v=jN96WQYOWu8

The Economist
https://www.economist.com/obituary/2020/05/28/antonio-bolivar-died-on-april-30th

O Globo
https://oglobo.globo.com/mundo/pandemia-do-coronavirus-invade-amazonia-colombiana-pela-fronteira-com-brasil-24412953

Colaboração: Pedro Rapozo (Sociologia, NESAM/UEA – Manaus e Tabatinga/AM)

Aldevan Brazão Elias, 46

Baniwa

Aldevan Brazão Elias, 46 anos, indígena do povo Baniwa, do Alto Rio Negro, faleceu de Covid-19, no dia18/04/2020. Ele era agente de combate às endemias da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS), da Secretaria Estadual de Saúde do Amazonas (Susam), defensor da saúde indígena, colaborador de cientistas e escritor.

Aldevan Baniwa, como era mais conhecido, segundo a agência de notícias “Amazônia Real”, nasceu na comunidade Castanheiro, no município de Santa Isabel do Rio Negro (AM). Ele tinha uma expressiva atuação na comunidade acadêmica, colaborando com produções científicas de pesquisadores. Foi casado com a antropóloga Ana Carla Bruno, colunista da Amazônia Real e professora da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), com quem teve duas filhas. Aldevan e Ana Carla são dois dos autores do livro “Brilhos na Floresta”, junto com os pesquisadores Noemia Kazue Ishikava e Takehide, além da ilustradora Hadna Abreu.

A cineasta Maya Da-Rin, que fez o lindo filme “A Febre” (2019), rodado em Manaus, escreveu a seguinte palavra em sua homenagem: “Aldevan foi uma das pessoas mais generosas que conheci. Em 2017 nos acompanhou em muitas das incursões que fizemos para a pesquisa de elenco de ‘A Febre’. Gostava de estar junto, conversando, partilhando ideias. A partir de então sempre ficamos em contato. Lembro dele explicando para os guardas o que era caxiri, quando fomos parados em uma blitz da lei seca ao voltar de uma comemoração do abril indígena, há exatamente três anos. Lembro das frutas que ele me apresentou, dos livros que me mostrou, da peixada que fizemos na sua casa logo antes das filmagens. A última vez que nos falamos foi no dia 20 de março. Aldevan era agente de saúde e estava trabalhando na linha de frente. Perguntei como eles estavam se protegendo. Ele me respondeu dizendo que ‘nós da saúde não podemos ficar em casa, temos que trabalhar no atendimento aos casos suspeitos’. Aldevan nunca pensou só em si. Que a sua estrela siga brilhando como uma flecha.

 

Há várias memórias: um vírus, uma história, muitas trajetórias (Ana Carla Bruno, Kaina e Win – Esposa e filhas de Aldevan Baniwa, em 18/04/2020)


1991, tranquei o curso de história e fui “ser professora” (aliás aluna da vida indígena) dos Waimiri Atroari, na Aldeia Alalaú (atentem para esta aldeia). Para chegar na aldeia, era preciso passar pela casa do senhor Valentin Elias (servidor da FUNAI), que carregava um tambor cheio de gasolina nas costas.

Entre 1991 a 1993, aprendi com os kinja um pouquinho de sua cultura e língua. Fui para roça, pescarias, festas, coleta de frutas, vi gente nascer, vi gente morrer, fiz amigos e aprendi a respeitar o modo de ser indígena.

Em 1996, retornando para área Waimiri Atroari, também no rio e aldeia Alalaú, conheci Aldevan Elias (Aldevan Baniwa). Tímido, calado, centrado em seu trabalho. Não lembro bem como começou, mas ao escutá-lo tocar no violão músicas de Legião Urbana e Engenheiros do Havaí fui me encantando e começamos a namorar. Entre Manaus e Belém (nesta época, eu era bolsista do Museu Goeldi), através de muitas cartas e raríssimos telefonemas (afinal Aldevan passava meses na aldeia), continuamos nosso relacionamento.

Em 1997, Aldevan foi conhecer meus pais e minha família no Recife. Olha, fez um sucesso!!! Todo mundo queria pegar em seu cabelo e meu pai chegou a dizer que queria ser o Aldevan. Lá deu seu primeiro mergulho no Mar. Em março de 1998, casamos. Na nossa pequena comemoração estavam alguns Waimiri Atroari e amigos do Programa Waimiri Atroari. Três dias depois, viajo para os Estados Unidos para iniciar o mestrado. Novamente, ficamos 9 meses separados e através de cartas sabíamos um do outro.

Dezembro de 1998: Aldevan chega em Tucson/AZ (o Amazonas indígena americano – terra dos Navajo, Hopi, Tohono O´odham, entre outras etnias) sem saber falar o verbo to be. Fácil? Não, não foi!!! Ele sentia falta da farinha, do rio, da família. Mas logo se entrosou com os brasileiros, os mexicanos, e não demoraria muito para o inglês dele ficar melhor que o meu. Sem sombra de dúvida, sua pronúncia era melhor que a minha!!! Sem vergonha, logo vieram as peladas com muitos americanos. Aprendeu a lidar com Adobe (material utilizado nas casas no Arizona), construindo algumas casas. Também, logo descobriu um rio no Mount Lemmon (localizado na Floresta Nacional de Coronado, ao norte de Tucson) e começou pescar trutas. Nunca comi tanta truta.

Não sabia andar de bicicleta e logo aprendeu na bicicleta que eu ia para universidade. Depois, comprou uma bicicleta de corrida e corria solto nas avenidas de Tucson. Também aprendeu a dirigir (olha Aldevan, até que você tentou me ensinar, mas não consegui aprender…)

Foram 5 anos em Tucson de muita batalha (você trabalhou como jardineiro, cuidador de um colega professor que tinha ELA, e como esquecer que você também atuou num documentário), cumplicidade e aprendizagem. Lá nasceram Kaina (2001) e Wina (2002). No parto da Kaina você quase desmaiou quando viu a agulha da Epidural. Mas o momento mais aldevaniano (quem o conheceu, entenderá) foi no nascimento da Wina. Ele cismou que queria que a Kaina participasse do parto. E claro, não funcionou. Kaina queria brincar com os instrumentos médicos. A médica num olhar fulminante falou para ele: retire esta criança daqui! E ele quis argumentar que, numa família indígena, os irmãos poderiam estar por perto…. Kaina herdou suas habilidades manuais. E Wina seu jeito sarcástico e teimoso.

No dia da minha defesa de doutorado, ele dizia com maior satisfação minha mulher é doutora em língua e cultura. Em agosto de 2003, voltamos os dois desempregados para o Brasil. Sem o apoio das nossas famílias não teríamos dado conta. E assim ficamos casados até 2016. O casamento acabou, mas a amizade e o respeito mútuo continuaram. Afinal tínhamos uma história e duas filhas. A cada conquista das meninas, ele vibrava, a cada visita de minha família e de amigos, ele estava presente. E, em 2019, virou escritor através da parceria com nossa amiga Noêmia.

Confesso, sempre foi um tabu para mim fazer pesquisa no Alto Rio Negro. O Alto Rio Negro, para além de um universo linguístico cultural fascinante, significa FAMÍLIA: é dona Joana (Tukano) e Sr. Emílio (Baniwa), avós das minhas filhas. São as tias e tios das minhas filhas, são os zilhões de primos. São as histórias do cotidiano contadas no sítio da Joanita, na ida para sua roça. É o peixe assado em Santa Etelvina. Vocês lembram do Sr. Valetin Elias, no ínicio do texto? Ele é tio do Aldevan por parte de pai (mas não época, eu não imaginava que casaria com seu sobrinho).

A COVID-19 tirou você de nossas vidas, mas não de nossas memórias e histórias. Tínhamos muitos planos para nossas filhas, não é??? Fique tranquilo pescando lá na Ilha da Oscarina (no Alto rio Negro) que eu cuidarei das meninas. Nestes últimos dias tenho dito para elas que você virou encantado.

Quero agradecer todos amigos do PWA, de Tucson, de Manaus, de Belém e do Recife pelas mensagens e lindos textos, pelo cuidado, pelo carinho…

Ana, Kaina e Wina.

 

Uma Carta (Ana Carla Bruno, Kaina e Win – Esposa e filhas de Aldevan Baniwa, em 18/04/2021)

Oi, eu não sei se você está pescando lá pelas bandas da Ilha Oscarina (Rio Negro), se você anda caçando ou andando de bicicleta. Por onde está…

Nas “internets” e “redes sociais” deste outro plano de encantamento, não sei se você está acompanhando o que está acontecendo pelas bandas de cá!!

As meninas e eu sempre falamos de você: quando assistimos a um filme; quando comemos peixe assado ( e claro, nenhum é igual ao seu); quando vemos alguma postagem sarcástica nas redes sociais; e sempre quando a campanhia toca por mais tempo do que deveria ( pois você tinha mania de ficar segurando quando vinha nos visitar).

Apesar do cansaço mental, da sensação de impotência e das dores das perdas ( e olha, foram muitas), estamos bem!!! MAS o Brasil, o Brasil:

– Você ainda estava entre nós quando o Mandetta saiu do ministério. Mesmo neste cenário de pandemia, já estamos com o quarto Ministro da Saúde;
– O perfil dos doentes de covid mudou, os pacientes agora são mais jovens;
– Mesmo depois de 1 ano, continuanos usando máscara, mas ainda existem pessoas que não acreditam na importância de seu uso;
– Ainda não podemos aglomerar, abraçar ou encontrar as pessoas que gostamos;
– Perdão, as meninas e eu ainda não conseguimos abraçar Sr. Emílio, Dona Joana Brazao, nossos sobrinhos(as), Tania Elias, Maria Do Socorro Elias, Magson Jesus.
Encontrei Andre Brazao e Lindomar Brazão na comunidade indígena Parque das Tribos, por meio de um projeto de pesquisa que estou participando.

Vi Solange Brazao e nos abraçamos com os olhos quando Dona Joana precisou ser internada quando Manaus sufocava por falta de oxigênio.

Sim, no dia 14 de Janeiro, aqui em Manaus, vivenciamos um cenário de horror… pacientes de covid morreram por falta de oxigênio nos hospitais. E agora, tristemente o Brasil todo está passando por situações similares…

Hoje, Manaus vive uma “amnésia coletiva”, parece que a pandemia acabou… e as pessoas insistem nas baladinhas. Por outro lado, os profissionais da saúde continuam tentando salvar vidas neste cenário caótico… mas saiba, eles estão exaustos e precisando de afeto e respeito.

Como eu poderia esquecer??? A Ciência e os cientistas venceram o tempo!!! Ao mesmo tempo, ambos sofrem com o negacionismo e as fake news. Mas temos VACINAS!! Mesmo com um número pequeno, devido a um “probleminha de gestão e diplomacia”. Apesar disso, o sistema SUS (para o qual você trabalhava) está dando seu melhor.

Kaina, Wina e eu, logo que você se encantou, fizemos 1000 tsurus de origami pela cura do mundo. Infelizmente, estamos vivenciando uma segunda onda:

– Atualmente, em média, temos 3 mil mortes por dia;
– Já atingimos mais de 370 mil mortos pela doença. Triste não é?
– Agora no domingo de Páscoa, Solange, Sr.Emílio e Magson fizeram uma surpresa: fizeram peixe e beiju para nós. Matamos a saudade de seu peixe. (Penso que cozinhar para o outro é uma demonstração de afeto)
– Sim, como poderia esquecer? O livro “Brilhos na Floresta” já foi traduzido para Baniwa, uma das línguas Yanomami, Kaingang e Guarani, além de sua versão em Nheengatu e da tradução para Tukano, que você chegou a ver…
Você conhece bem a nossa amiga Noemia Kazue Ishikawa, ainda estamos fazendo estripulias, pensando na década das Línguas Indígenas do Mundo, que será comemorada entre 2022 e 2032. Mas saiba, o grupo de pesquisa “Cogumelos da Amazônia.a” sente sua falta.

Não importa onde você esteja, suas filhas e eu esperamos que você esteja bem neste plano dos encantados.

Ana, Kaina e Win

FONTES

Foto de Destaque: Reprodução// BNCAmazonas

Fotos da Galeria: Amazônia Real; Acervo da Família; Steven Bird; Acervo da Família; (IDEM); (IDEM); (IDEM); ISA-Sociambiental

Amazônia Real
https://amazoniareal.com.br/aldevan-baniwa-que-denunciou-a-falta-de-testes-para-covid-19-morre-em-uti-de-manaus/

BNC Amazonas
https://bncamazonas.com.br/rapidinhas/agente-fmt-fvs-indigena-baniwa/aldevan-baniwa-1-2/

ISA- SocioAmbiental
https://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-socioambientais/uma-estrela-baniwa-a-brilhar-no-ceu

Steven Bird
http://www.stevenbird.net/blog/nhengatu-a-timely-lesson-in-language-preservation