Domingos Venite, 68

Guarani-Mbyá

Domingos Venite ou ainda Domingos Karai, Guarani Mbya , 68 anos, era Mburuvixá (cacique) e um grande Xondaro (guardião) no Tekoa Sapukai – TI Guarani do Bracuí, localizada em Angra dos Reis, a maior Terra Indígena do estado do Rio de Janeiro, fica na região da Costa Verde. A TI tem aproximadamente 500 habitantes e, segundo a prefeitura de Angra dos Reis, já tem pelo menos 88 casos confirmados da Covid-19. Seu Domingos Karai foi uma importante liderança para o povo Guarani Mbyá. Ganhou destaque em vários momentos da luta indígena, como no processo de demarcação da Terra Indígena Guarani do Bracuhy – Tekoa Sapukai, em 1994.

Segundo a nota de pesar do Centro de Trabalho Indigenista (CTI): “A notícia da morte de Domingos Venite, cacique da aldeia Sapukai, município de Angra dos Reis (RJ), entristeceu a manhã de todas e todos do Centro de Trabalho Indigenista nesta terça-feira (21/7). (…) Ainda nos anos 1990, Domingos foi o primeiro agente de saúde na aldeia Sapukai. Liderança fiel ao xamõi (ancião) João da Silva Wera, trabalhou também um período de sua vida, na equipe de Saúde, no Vale do Ribeira. Foi um grande amigo e colaborador, repassando seus conhecimentos aos parceiros que apoiaram a luta guarani por seus direitos.”

No dia 26 do mês de Junho, seu Domingos foi encaminhado para o Centro de Referência para Tratamento de Covid-19 (Santa Casa), ficou internado por quase um mês e veio a falecer devido as complicações advindas da infecção pelo novo coronavírus, na madrugada desta última terça-feira (21/06/2020). No Boletim Oficial da Prefeitura de Angra, foi publicado um luto de 3 dias em memória e respeito ao falecimento de seu Domingos Karai. Como podemos perceber Domingos Venite foi uma liderança admirada e respeitada tanto por indígenas como pelos não-indígenas.

 

A Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), manifestou sobre esta perda:


É com muito pesar, que a Comissão Guarani Yvyrupa vem informar o falecimento do  cacique Domingos Venite da aldeia Sapukai  na madrugada de hoje.  Ele estava internado desde o dia 26 de junho, na Santa Casa em Angra dos Reis RJ, onde estava recebendo o tratamento da Covid 19.    

Cacique Domingos tinha 68 anos foi um dos primeiros motoristas indígenas a trabalhar na saúde indígena. Sua luta sempre foi pelos direitos do nosso povo. O povo Guarani está de luto, por mais essa perda irreparável para nós.      

Essa doença Covid 19 está matando nossos líderes sábios, ainda leva junto a força dos nossos cantos e danças que é dos nossos rituais de passagem que nos sempre fazemos dentro da tradição e costume. Faremos nosso canto nosso rezo, faremos nossas danças de passagem para o Xamõi Domingos mesmo sem poder nos despedir, mas sabemos que seu espírito segue rumo a Yvy Maraē’y, e que sempre nos proteja a nós e todas as nossas crianças.        

Mbaraete Py’a guaxu pavê nhane rentarã’i kuery.

Aguyjevete!

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), registrou:


Para nós nunca morrem aqueles que têm conexão com o útero da Terra. O cacique Domingos Karai, Ancestralizou. Grande liderança do povo Guarani Mbya, da comunidade Sapukai, município de Angra dos Reis, Rio de Janeiro, Karai era fonte de inspiração e exemplo de luta. Companheiro de todo o movimento, trabalhou duramente pela saúde indígena.

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), juntamente com todas as suas organizações de base, se solidariza com o povo Guarani Mbya e com toda a família do cacique Domingos neste momento de dor.

Karai é mais uma vítima da pandemia da Covid-19 que atinge violentamente os povos indígenas do Brasil. Ele é o 6º indígena que morreu pela doença do povo Guarani Mbyá que está com 258 pessoas que testaram positivo para o novo coronavírus (bit.ly/dados_indigenas).

Em memória do nosso companheiro cacique Domingos, seguimos firmes na luta!

 

Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpin-Sul)


A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul, comunica com muito pesar a noticia da morte de mais uma liderança indígena por corona vírus. Domingos Karai, cacique da Terra Indígena Sapukai, do povo Guarani Mbya em Angra dos Reis. Grande companheiro de luta no movimento indígena e especialmente pela saúde indígena. A Arpinsul e todo o movimento indígena estão de luto diante dessa perda.

A cada parente que se vai, um pedacinho de cada um nós também se perde, principalmente diante da perda de um grande guerreiro, exemplo e inspiração. Hoje todos os 305 povos indígenas do Brasil estão de luto, somos todos parentes e a dor da perda de uma vida indígena dói em todos nós!

Diante desta triste perda, a Arpinsul em nome dos povos indígena do sul, envia nossas condolências ao povo Guarani Mbya, aos familiares do cacique Domingos Karai e a todos os parentes que choram por mais uma morte indígena.

 

Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ)


É com bastante pesar que informamos o falecimento do Cacique Domingos Venite. Ele era o líder da aldeia Guarani Sapukai, a maior aldeia indígena do estado do Rio de Janeiro, localizada em Angra dos Reis, na Costa Verde.

Domingos foi parceiro da Fiperj em trabalhos relacionados a criação de tilápias na região.

A Fiperj manifesta solidariedade à família do Cacique, ao Povo Indígena Guarani e a todos e todas que lamentam sua partida.

 

Capina, Organização Não-Governamental (ONG), registrou:


A Capina lamenta muito a perda de Domingos Karai, cacique da Terra Indígena Sapukay, do povo Guarani Mbya em Angra dos Reis. Domingos faleceu nesta madrugada de Covid-19, doença que tem assolado os povos indígenas do nosso país.
A aldeia Sapukay está integrada a um projeto de Turismo de Base Comunitária para o qual a Capina vem trabalhando por intermédio de oficinas de pesquisa de mercado participativa.
Enviamos nossas condolências e solidariedade ao povo Guarani Mbya, aos familiares do cacique Domingos Karai, à Rede Nhandereko e ao Fórum de Comunidades Tradicionais.

 

Kretãkaingang Kaingang, disse que:


Durante a vida temos oportunidade de conhecer vário guerreiros e guerreiras.
Seu Domingos foi um dos que conheci e tive a oportunidade de lutar ao seu lado. Um grande homem. Guerreiro.

Cacique Domingos que Deus o receba, meus sentimentos ao povo guarani e aos seus familiares.

 

Tânia Maria de Lima, amiga de seu Domingos, registrou:


Nas inúmeras vivências, em diversas comunidades humanas, ganhamos muitas experiências. Eu me sinto honrada em viver uma amizade profunda com os Guarani. E hoje me sinto muito triste pela morte de Domingos Venite. Foram 28 anos de convivência e troca intercultural. Principalmente neste ano de 2020, estávamos muito próximos, pensando formas de solidariedade para ajudar na aldeia, frente ao isolamento social da quarentena. Domingos, preocupava-se com todo o seu povo e também com as outras aldeias do Rio de Janeiro. O luto de 3 dias decretado pela prefeitura Municipal de Angra dos Reis é um símbolo importante de sua trajetória e diálogo com a sociedade envolvente. Domingos era um homem de unidade, aberto ao diálogo, conversa franca, mas sempre pacífica! Hoje perdi esse amigo querido, alguém que sempre me presenteava com suas palavras belas e sábias. Aguyevete! Seu tempo foi fecundo. Agora ficam as suas boas sementes.

 

Patrícia Oliveira de Souza Siqueira, lamentou: 


Que grande perda, foi embora seu Domingos Venite. Um grande líder indígena que tive o imenso prazer de conhecer nas reuniões do Fórum Voz aos Povos. Lutou pelos direitos do seu povo. Lembro que o senhor ficou muito triste com a morte do meu pai. E hoje vejo no jornal a triste notícia da sua morte. Que Jesus conforte o coração dos familiares neste momento. Muito triste.

 

Niltinho Júdice, manifestou:           


Hoje um o Cacique Domingos Venite chega na Terra Sem Males. A mba’e meguã que assola a humanidade faz muitas vítimas, inclusive gentes do bem. Domingos era um homem de teko porã, o Nhanderequeí dessas terras. Vai Domingos, vai para Yvyv Marã’y ser recebido por Pa’i Kuara.

 

Marco Santos, Engenheiro Ambiental, declarou:


Aprendi muita coisa na língua indígena com essa liderança, participei junto com ele da demarcação da atual Terra Indígena e fizemos várias expedições na Serra da Bocaina, para localizar as divisas da TI. Lamentável essa grande perda, era um bom amigo.  Angra dos Reis perdeu uma importante parte da sua história para essa pandemia que assola a população em todo canto do mundo.

FONTES

Foto em Destaque: Reprodução//Facebook Arquivo Pessoal de Niltinho Júdice

Fotos na Galeria: Centro de Trabalho Indigenista (CTI); (IDEM); Comissão Guarani Yvyrupa (CGY); Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ); Janaína Oliveira; Arquivo Pessoal de Domingos Venite; Conselho Indigenista Missionário (CIMI); Niltinho Júdice; Janaína Oliveira; Severino Silva; Lukas Emílio Tikuna

Reprodução//Facebook Arquivo Pessoal de Niltinho Júdice
https://www.facebook.com/photo?fbid=3333729693315573&set=gm.3558108180885185

Centro de Trabalho indigenista (CTI)

https://www.facebook.com/trabalhoindigenista/posts/3149016175186457

Conselho Indigenista Missionário (CIMI)

https://www.facebook.com/conselhoindigenistamissionario/videos/348542515821865

Revista Fórum
https://revistaforum.com.br/coronavirus/cacique-domingos-venite-morre-com-coronavirus-em-angra-dos-reis/?fbclid=IwAR3KlZb8Em19HK640WvdGGYrkuZfAXOaaihehU8pjOojmqkSWLaarmtUlkI

Brasil de Fato
https://www.brasildefato.com.br/2020/07/21/cacique-domingos-morre-apos-semanas-internado-em-angra-dos-reis-rj-por-covid

G1
https://g1.globo.com/rj/sul-do-rio-costa-verde/noticia/2020/07/21/cacique-de-aldeia-em-angra-dos-reis-morre-vitima-do-coronavirus.ghtml

Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro
https://www.facebook.com/Fiperj/posts/3155886714489339

Comissão Guarani Yvyrupa (CGY)

https://www.facebook.com/yvyrupa/posts/3265627846837749 

Reprodução//Facebook Arquivo Pessoal de Severino Silva

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Reprodução//Facebook Arquivo Pessoal de Lukas Emílio Tikuna
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Reprodução//Facebook Arquivo Pessoal de Janaína Oliveira
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Reprodução//Facebook Arquivo Pessoal de Patrícia Oliveira De Souza Siqueira
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Fabricio Uprewa, 42

Xavante

Relato de homenagem feito por Cristovão Xavante, transcrito por Érica Dumont (Enfermagem e FIEI – FaE, UFMG ).


Sr. Fabrício Uprewa, Xavante, 42 anos, era técnico de enfermagem da aldeia Sangradouro e morador da aldeia São Marcos, onde se casou, ambas terras indígenas Xavante, na Amazônia legal. Sr. Fabrício, trabalhou até o dia que Deus lhe chamou quando então finalizou sua missão na terra. Ele, como todo mundo sabe, é conhecido como um técnico incansável e preocupado com os pacientes. Não media esforços…manha, tarde, noite eram tempos de seu trabalho e assim foi durante a pandemia que atacou a aldeia. Eu, Cristovão Xavante, fui uma das testemunhas vivas de seu trabalho já que fui acometido pela Covid no final de maio quando fiquei internado…Ele constantemente saia da UBS (Unidade Básica de Saúde) e deixava os medicamentos de casa em casa. Como disse, para ele não importava a hora do dia: manha, tarde ou noite, seu foco era o paciente. Eu, quando estava no extremo de minha saúde, atingida pela Covid, tomava remédios de ervas medicinais dos meus ancestrais e também os remédios farmacêuticos. Fui aconselhado por Fabrício a tomar os dois remédios, o do indígena e do não indígena, já que não se tratava de medir a força de cada remédio mas da sabedoria para que juntos eles fizessem efeito. E eu observava muito o sorriso dele já que Fabrício não escondia o sorriso, a alegria de poder ajudar alguém que precisava. Fabrício me tirou dessa crise,  quando recebi o teste negativo e o esperava para me aplicar o soro que daria mais força pro meu corpo, ele não foi e soube que estava fora do trabalho. Fabrício começou a passar mal estava se cuidando em casa. Não passaram dois dias que ele já não estava bem na aldeia quando foi levado as pressas pra cidade para maior suporte de saúde. Não demorou uma semana de tratamento na cidade e ele já voltou dentro do caixão. No momento que eu escutei essa notícia eu não acreditava porque ainda era muito presente a imagem dele me atendendo, aplicando injeção com remédio e tudo e de repente ver ele no caixão. Eu não acreditava. Por que esse senhor teve que partir? Qual foi a missão dele? Nos tirar dessa crise, dessa doença maligna da Covid, e de repente ele não está mais? Então, é importante o elevarmos a altura que ele merece e agradecer imensamente por seus trabalhos e sua disponibilidade. Esse é o meu agradecimento a essa pessoa maravilhosa, do bem, que se entregou para dar vida aos outros. Tenho certeza que está no lugar que ele merece e aqui transmito a todos que puderem ler esse relato, que todos merecemos viver e alguns se sacrificam para que nós que testemunhamos possamos viver e lutar por ainda mais vida.

 

Doüglas Hěnriquē Irazäbä, neto de Fabrício, falou sobre a perda:


Meu avô… sua partida quebrou meu coração. Você sempre me chamava de sucesso, mas agora você não está mais aqui. E não pode mais me chamar de sucesso. Isso vai me fazer muita falta. Mas, as memórias que guardo de momentos com você são para sempre. Elas que me consolarão neste momento. Saudades eternas. Luto Fabrício Uprewa. Descanse em paz.

 

Marcelo Wa’airo, sobrinho de Fabrício, comentou:


Que Deus os receba com alegria e amor. Pois aqui na terra, sabemos que o senhor fará falta. Nunca vou esquecer dos conselhos que o senhor me dava quando eu era pequeno ainda. Mas, infelizmente, aquele nosso combinado da gente estar juntos no mesmo ambiente de trabalho, ficará pra depois.  Daqui pra frente, seguiremos de cabeça erguida. Sempre com força, igual ao que o senhor disse. Pode apostar meu pai, depois de formar em enfermagem, irei fazer Medicina, com certeza. Estou seguro de que o senhor ficará alegre quando eu fizer essa conquista.  Descanse em paz meu pai (tio).

 

Aihé’édi Õmohi, amigo de Fabrício, falou:


Somos amigos desde jovens, isso já faz uns 20 anos. Trabalhamos juntos no polo base de São Marcos. A gente sempre se divertia e fizemos várias viagens juntos. Nossos sonhos e o nosso futuro era o de sempre sermos amigos e ficarmos juntos até envelhecer, mas não deu certo esse nosso sonho. Nosso caminho foi Deus que escolheu. Será eu? Não. Foi meu amigo que resolveu partir e ele foi, partiu. Antes que ele fosse encaminhando para UPA, disse: “Se cuide amigo. Estou partindo, mas voltarei logo para agente trabalhar junto, quero terminar meu serviço, vou fazer minha escala”. Ele chorou e me abraçou bem forte. Saiu e foi embora em lágrimas. E assim foi que partiu esse grande amigo do meu coração!

Descanse em paz amigo, você é muito corajoso.

 

Gerson Wa’raiwe, comentou:


Muito triste perder um amigo e irmão que desde pequeno cresce contigo e compartilha os movimentos de sua vida. Agora entre tantas saudades, a notícia dessa perda. Certeza que Deus o acolherá em eternidade. Descanse em paz saudoso irmão Fabrício.

 

Thalyta, colega de trabalho de Fabrício, destacou:


Descanse em paz meu amigo, grande companheiro de profissão. Você era meu orgulho!!! Nem sei como vai ser sem você, Fabricio Uprewa. Você sempre foi muito valente e guerreiro. E sempre que lembrarmos de você, vai ser de como fazia diferença!! Descanse em paz, cara… vai fazer muita falta.

FONTES

Foto em Destaque: Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal de Fabrício Uprewa

Fotos na Galeria: Enviada por Sr.Cristovão Xavante; Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal de Fabrício Uprewa; (IDEM); (IDEM); (IDEM); (IDEM); Thalyta; Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal de Fabrício Uprewa; Sergio Henrique Ribeiro; Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal de Aihé’édi Õmohi; Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal de Fabrício Uprewa.

Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal Fabrício

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Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal Thalyta

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Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal Sergio Henrique Ribeiro

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Reprodução//Facebook: Arquivo Pessoal de Aihé’édi Õmohi

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Neuraci Ramos de Oliveira, 44

Ticuna

Homenagem escrita em conjunto pela Campanha Kanmari, Felipe Milanez(UFBA), Lino João Oliveira Neves(UFAM), Barbara Arisi (UNILA), Armando Soares (Sertanista e indigenista da Funai aposentado).


Com pesar informamos o falecimento ocorrido no dia 8 de julho de 2020, por COVID-19, de Neuraci Ramos de Oliveira, Indígena pertencente ao Povo Ticuna. Neuraci tinha 44 anos, era companheira de Higson Kanamari Warü, liderança do Povo Kanamari, da Terra Indígena Vale do Javari (Amazonas). Juntos tiveram oito filhos, e três netos. Presidente da Associação dos Kanamari do Vale do Javari (AKAVAJA), Higson é uma das principais lideranças da região. O Povo Kanamari foi diretamente afetado pelo novo coronavírus desde 3 de junho, quando Agentes de Saúde infectados, sem atender ao protocolo da quarentena e prevenção de contágio, contaminaram três indígenas. No presente momento há mais de 100 Indígenas do Vale do Javari contaminados nas aldeias.  

Neuraci nasceu e se criou na comunidade ticuna ribeirinha Terezina 4,  Alto Solimões. 

O povo Ticuna também tem sido um dos mais afetados pela Covid-19, com alto índice de infecção e óbitos neste povo, tanto os que vivem em contexto urbano quanto os que estão em seu território tradicional. 

Palavras de Higson Kanamari Warü:

“Sempre foi uma mulher guerreira, que lutava junto comigo a luta do Movimento Indígena. Nos tempos que eu precisava estar em área ou em viagens, às vezes quatro, cinco meses ausente na luta do Movimento Indígena que me levava para distante, Neuraci assumia o papel do pai e da mãe que cuidava das crianças e protegia nossa família. Foi uma mulher alegre, que acolheu pessoas próximas, sempre apoiou os parentes indígenas e nunca deixou ninguém de estômago vazio. É uma tristeza muito grande para todos os povos do Alto Solimões e Vale do Javari. Só tenho a agradecer a Deus pela vida que ele nos deu.” 

Todos os apoiadores e apoiadoras da campanha Kanamari Urgente nos solidarizamos com os Povos Kanamari e Ticuna e reforçamos nosso compromisso de lutar pela vida e pela memória, contra o genocídio.

Lucas Gabriel, 0

Tupinikim

A homenagem dessa postagem é em memória de Lucas Gabriel Ramos Bolonese, bebê indígena vítima de um processo de abortamento inevitável advindo das condições da Covid-19.

 

A notícia da gravidez de Lucas Gabriel foi uma novidade muito bem recebida por todos os membros da família Ramos Bolonese. Família que pertence ao povo Tupinikim e reside na aldeia Caieiras Velhas, em Aracruz, na região norte do Espírito Santo. O pai e a mãe de Lucas Gabriel, David Bolonese Soares de 35 anos e Mbotyra Tupã (que significa Flor Divina) de 31 anos, também conhecida por Jaciele Pego Ramos Bolonese, estavam super felizes em saber que a família aumentaria. Alegria que também era compartilhada por seus três irmãos de 13, 9 e 2 anos.

Na conversa com David foi relatado que o bebê foi entregue em um recipiente de plástico, fechado apenas com uma fita adesiva e que a família teve que passar um final de semana com ele em casa. A mãe, positiva pra Covid-19, ainda um pouco desorientada e sem saber como proceder disse que colocaria o seu bebê em um frasco de vidro porque ela já o sentia como parte da família.

David, ainda acrescentou que: “através de toda essa história que nos aconteceu, a saúde indígena no município de Aracruz está sendo muito visada, nossa saúde da aldeia está sendo muito notada. A saúde indígena recebeu uma notoriedade muito grande, através dessa nossa história. Então, apesar da tristeza, a gente entendeu que ele (Lucas Gabriel), veio pra cumprir uma missão. E essa missão foi cumprida. Porque a gente estava se sentindo bem abandonados aqui na aldeia”. (Grifo nosso)

Optamos por realizar a transcrição integral do vídeo-denúncia que foi feito pelos pais David e Jaciele. No vídeo percebemos a indignação do pai, bem como notamos o quão a mãe de Lucas Gabriel estava abalada com toda essa situação delicada e complexa pela qual teve que passar. Devido ao descaso do hospital e também ao novo contexto trazido pela pandemia do novo coronavírus, Jaciele teve que passar por toda a situação relatada a seguir sem o acompanhamento de qualquer familiar.

Relato transcrito do vídeo-denúncia feito por David Bolonese e Jaciele Ramos:

“Gente, boa noite. Estou fazendo esse vídeo, porque eu quero relatar a indignação que eu tô com a Maternidade do Hospital São Camilo de Aracruz. Na semana passada, no dia 25 de Junho, a minha esposa, gestante de 14 semanas, quase 15. Foi ao hospital porque ela estava passando muito mal, foram feitos alguns exames, né? Comprovando que ela realmente era gestante, nessa quantidade de tempo. E foram feito alguns exames em que foi constatado que ela estava com um descolamento de placenta. Mas, ela foi testada também como positiva para a Covid-19. Então, mandaram ela embora de volta para a casa.

E uma semana depois, mesmo ela fazendo muito repouso, ela passou mal novamente e foi encaminhada de novo para o hospital, na maternidade do São Camilo. Foi feito outro exame que no caso disse que, uma semana depois, foi falado que placenta estava colada e que ela estava fora de perigo. Então, ela foi mandada de volta para a casa. Ela sentindo dor de cólica e a médica que atendeu ela, falou que era normal ela sentir as cólicas. No dia seguinte, ela passou muito mal. Uma cólica muito forte. Ela teve um aborto. Um aborto em casa. Sofreu um aborto e foi encaminhada novamente para o hospital, pela equipe de saúde aqui da aldeia indígena de Caieiras Velhas, aonde a gente reside atualmente.

Chegando no hospital ela ficou lá, ela reclama que ficou muito tempo sangrando sozinha, porque eu não pude acompanhar. Porque como ela testou positivo pra Covid, nós temos três filhos e eles não podem ficar com ninguém, pela questão do contato, então, eu tive que ficar em casa. Ela foi encaminhada sozinha ao hospital, juntamente com a nossa enfermeira aqui da aldeia de Caieiras Velhas. Ela disse que ficou muito tempo sozinha, numa sala isolada. Quando ela foi levada para a cirurgia de curetagem, era já tarde da noite. Porque quando ela foi encaminhada para essa cirurgia, eles tinham colocado outra pessoa na frente dela. Ela sem saber o que estava acontecendo realmente. Foi encaminhada para cirurgia caminhando, mesmo debilitada pela doença (Covid-19) e pela questão do aborto. Ela foi levada caminhado para essa cirurgia. Chegando lá, ela topou com a porta fechada, porque já tinha alguém na cirurgia. E nem a técnica de enfermagem que tava com ela, sabia que essa pessoa estava na sala. Então, ela retornou de novo pro quarto, para depois ser novamente levada para a sala de cirurgia.

Até, então, conheço que isso pode, sim, acontecer. Porque a gente vê que é uma falta de comunicação muito grande. Mas, o que está me indignando no momento é que, sem nenhum motivo de explicação, eles entregaram o feto pra ela trazer pra casa. Tá aqui o feto. Eles pegaram simplesmente um litro de soro. Aparentemente um recipiente de um litro de soro. Cortaram, encheram de formol. Colocaram o feto dentro. Passaram uma fita (adesiva). E entregaram para ele. Disseram que ela tinha que trazer pra casa. E hoje a gente tá aqui e a gente não sabe o que fazer com o feto. Eu não tenho coragem pra enterrar. Eu não sei se posso fazer isso (por causa da Covid-19).

A nossa enfermeira aqui disse que não tem conhecimento também do que possa ser feito, porque ela não tem conhecimento de que o hospital poderia ter feito isso. Como ela estava de 14 semanas, acredito que esse feto teria que ter um destino dado pelo hospital. E, realmente, não sei o que fazer. A gente não tem mais o que pensar. Eu acho uma falta de respeito muito grande. Sofre, ela chora… olhando para o feto. Acho desnecessário isso, uma falta de respeito. Acho que o hospital tinha que destinar esse feto. Não sei o que fazem lá, o feto era novo, 14 semanas. Minha esposa, comentou com a técnica de enfermagem de lá sobre o que ela tinha que fazer. E a técnica respondeu que ela que tinha que saber o que fazer. Eu acho uma falta de respeito muito grande.

Então, eu peço que vocês compartilhem esse vídeo, para chegar até um responsável. Porque tem um coordenador do hospital, tem o médico, tem a enfermeira e tem a técnica de enfermagem. Então, são quatro profissionais e isso aconteceu, sabe? Eu achei uma falta de respeito muito grande, está sendo um sofrimento muito grande pra ela. Esta horrível aqui pra gente. Conviver com essa situação. Então, quero que o vídeo chegue até eles, pra que eles entrem em contato comigo pra me dar uma resposta, pra me dar uma explicação do que realmente aconteceu. Eu agradeço muito a vocês que puderem compartilhar esse vídeo pra chegar lá. Eu vou correr atrás dos meus direitos, dos direitos da minha família.

Estou me sentindo muito constrangido por essa situação. Realmente a gente já está sofrendo pela perda dessa criança. Sofrendo pela Covid,  ela está bem abatida, todo mundo tá vendo. Está sendo um sofrimento muito grande. A gente está isolado. Totalmente isolado, sabe? E eu vou correr atrás dos meus direitos. E eu quero uma resposta do hospital de como fazer. Se isso é um protocolo. Ou se isso é realmente porque eles pouco se importaram. Teriam que ser feito um exame no feto, para constatar o óbito e não foi feito.

Não sei o motivo do aborto, o real motivo. Eu acredito que tenha sido pela Covid porque ela ficou muito abatida. Eu não sei do que a criança faleceu. Eu não posso nem colocar essa criança na estatística da covid, porque eles não me deram um documento provando. Eu não tive o direito de saber o porque que essa criança foi abortada. Então, eu peço que compartilhem esse vídeo, por gentileza. Para que chegue até um responsável do hospital, pra que entrem em contato comigo ou com a equipe de saúde aqui da aldeia, pra dar uma justificativa. Eu agradeço muito vocês aí, muito obrigado e uma boa noite.”

Lucas Gabriel significa o iluminado que tem a força divina, veio para cumprir a missão de ajudar a dar visibilidade para a saúde indígena de seu povo, na aldeia Caieiras Velhas, Aracruz (ES).

Lucas Gabriel, presente!

FONTES

Imagem em Destaque: Colagem feita pelo artista Kadu Xukuru (Instagram: @kaduxukuru)

Imagens da Galeria: Colagem feita pelo artista Kadu Xukuru e imagens David Bolonese Soares.

Vídeo-denúncia:

https://www.facebook.com/david.bas.35/videos/112096627233026

Domingos Mãhörõ, 60

Xavante

Domingos Mãhörõ nasceu no sudeste do Estado do Mato Grosso, na aldeia Dom Bosco, município de Poxoréu, próximo à região do rio Cristalino, bacia do Rio das Mortes. Ele foi uma importante liderança Xavante da TI Sangradouro e se destacou em alguns momentos na luta dos povos indígenas em Mato Grosso. Seu Domingos viajou por vários países, levando inúmeros ensinamentos de seu povo e defendendo os direitos originários nos quatro cantos do mundo.

Segundo as informações contidas em um material produzido em 2000, por seu filho Jesus e em parceria com o Colégio Cotiguara, seu Domingos era visto como “um homem de visão ampla, preocupava-se com a estrutura de toda nação indígena na sociedade brasileira, possuindo o desejo de ver os verdadeiros donos dessa terra Brasil engajados no milênio que se inicia; não como observadores da nova era, e sim como ativos personagens transformadores da história deste país”. Domingos Mãhörõ era cacique na aldeia Dom Bosco, foi casado e pai de oito filhos (seis mulheres e dois homens). Era reconhecido pela sua comunidade como um Xavante “determinado, sonhador, culto, profundo conhecedor das tradições de povo (…) um ferrenho batalhador das causas indígenas.”

Estudou até completar o segundo grau e, então, formou-se professor, profissão que exerceu durante um bom tempo. Foi um verdadeiro autodidata. Para além da sua língua originária e do português, falava também espanhol. De acordo com o seu amigo Antonio Carlos Ferreira Banavita “Domingos era um apreciador da boa música, em especial a música andina. Por diversas vezes, gravei para ele inúmeros cd’s e depois gravei também alguns pen drives com músicas andinas”, inclusive, na galeria desta homenagem tem duas fotos que seu Domingos aparece com um violinista boliviano.

Além de ser cacique na aldeia Dom Bosco, era o presidente da Cooperativa Indígena Grande Sangradouro e Volta Grande (COOINGRANDESAN). Infelizmente, seu Domingos Mãhörõ faleceu no dia 06 de julho de 2020, aos 60 anos, na cidade de Cuiabá, por complicações da infecção pelo novo Coronavírus. Domingos Mãhörõ é mais uma pessoa indígena que se vai com esta pandemia da Covid-19, vítima fatal do vírus e do descaso do governo com a saúde dos povos indígenas no Brasil.

Domingos Mãhörõ já estava internado desde o dia 25 de junho, em um hospital particular do município de Primavera do Leste. Lá o estado de saúde do cacique foi se agravando. Ele aguardou por pelo menos três dias uma transferência para outro hospital com disponibilidade de um leito em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em Cuiabá, capital do estado, a cerca de 240km da cidade de Primavera do Leste. Para conseguir essa transferência para o Hospital Estadual Santa Casa, a família do cacique teve que entrar com um pedido de urgência na Justiça. Após a transferência para a UTI seu Domingos Mãhörõ continuou apresentando complicações da doença, dentre elas sofreu duas paradas cardíacas e, infelizmente, não resistiu.

 

Sua sobrinha Samira Tsibodowapré Xavante falou sobre essa grande perda para o povo Xavante:

 

Hoje perdemos mais um guerreiro para a Covid-19. Nosso Grande Guerreiro, meu tio, Cacique Domingos Mãhörõ, ao saber que eu estava em Sangradouro, foi até meu marido e pediu para me ver. E quando me viu, segurou a minha mão e se emocionou. Disse que estava com muitas saudades do meu pai e que quando fosse para Campinápolis iria visitar o túmulo do irmão. Falou que ao me ver estava vendo o meu pai. E complementou dizendo que tinha também uma filha chamada Raíssa e desejava que eu a conhecesse, referindo-se à xará de minha irmã Raíssa. Disse tantas palavras bonitas e de incentivo! Me incentivou a continuar a luta de meu pai. Ele estava muito emocionado e eu também. Disse ainda que estava lutando pelo nosso povo, pelo o povo de Sangradouro. E que ele não se importava com as críticas, pois essa era a luta dele. Mal eu sabia que, tio, era essa a nossa despedida. Eu não sabia. Que Deus te receba hoje.

 

O pesquisador e antropólogo Adelino Mendez registrou:

 

Domingos partiu, a COVID-19 levou Mãhörõ.

A primeira vez que fui à Funai, em 1990, com Sidney Possuelo, fui conhecer o então “Departamento de Índios Isolados”. Na entrada do prédio fui apresentado para o cacique Domingos Mãhörõ. Ontem, depois de esperar atendimento em uma UTI por 3 dias, Mãhörõ se foi.

O povo Xavante perde uma grande liderança, formada pelos velhos Xavante.  A aldeia Dom Bosco e o povo Xavante passam por uma tragédia.

Vá com Deus meu amigo.

 

O fotógrafo e documentarista Antonio Carlos Ferreira Banavita registrou:

 

Dia muito difícil, perdi um grande amigo, um irmão, o xavante Domingos Mãhörö, amizade de mais de 20 anos. Fui com meus filhos ainda crianças na aldeia que ele viveu por muitos anos, Aldeia D. Bosco, à margem do rio Cristalino, onde ele desemboca no Rio das Mortes.

O povo Xavante perde um grande líder, um diplomata, um ser humano conciliador, educado, inteligente, um grande orador, um defensor e divulgador da sua cultura. Conheceu vários países, mas nunca saiu da sua aldeia. Saía para as viagens na busca de fortalecer o seu povo, sua cultura, voltava para a sua aldeia sempre.

Na foto eu e ele, em 6 de julho de 2007, há exatos 13 anos.

Em outra postagem, Antônio, acrescentou:

Depois de mais de 20 anos de amizade, meu amigo, guerreiro xavante Domingos Mãhörõ, sempre na luta pela autonomia do seu povo, foi vencido pelo Covid19. Gravei nosso último encontro no final do ano passado. Estávamos conversando eu, Domingos e Vinícius, meu filho, que na sua infância muitas vezes acompanhou-me à aldeia do Domingos e nadou no Rio Cristalino. Domingos explicou por que usava para o nosso encontro o tipo de madeira que vai na orelha, pois para cada situação tem uma madeira diferente de acordo com a cultura. Pareceu uma despedida. Foi a última vez que estivemos juntos. Continuamos a nos falar por telefone nas vezes que ele ia à cidade, falamos dia 3, ele já hospitalizado disse que estava um pouco melhor. Mas, hoje, a triste notícia. Perdi um grande amigo, um grande ser humano, inteligente, um diplomata, forte na sua cultura, um grande líder, que deixou um legado na defesa da autonomia do seu povo.

Domingos agora vai para a aldeia dos espíritos, juntar-se a também meus amigos, seu pai, mãe e esposa. Que na crença e nos rituais do povo Xavante encontrem a paz tão desejada pelo meu amigo Domingos.

FONTES

Foto em Destaque: Antônio Carlos Ferreira Banavita
Fotos na Galeria: Todas as fotografias são de Antônio Carlos Ferreira Banavita

Links para os textos de Reprodução//Facebook

Adelino Mendez

https://www.facebook.com/photo?fbid=3057575667692604&set=a.108105445972989

Samira Tsibodowapré Xavante

https://www.facebook.com/photo?fbid=3120686924677749&set=a.285040311575772

Antonio Carlos Ferreira Banavita

https://www.facebook.com/antoniocarlos.ferreirabanavita/posts/3119483464779372

https://www.facebook.com/antoniocarlos.ferreirabanavita/videos/3119705234757195

CD-ROM sobre a Cultura Xavante (2000) – Todo o conteúdo do CD foi repassado pelo cacique Domingos Mãhörõ. As informações foram coletadas e organizadas pelo seu filho Jesus: inúmeras fotos, filmes, textos que digitou e gravações de sua própria voz em narrativa xavante.

classinformatica.com.br/projetos/auwe/

Kypatyry Kypyxyry, 90

Apurinã

Homenagem escrita pela antropóloga Juliana Schiel e por Maypatxi (Vanessa Apurinã Souza) – Secretária Executiva da Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi (OPIAJ)

 

No dia 16 de junho, Kypatyry Kypyxyry, seu Moacir de Souza Apurinã,  faleceu de Covid-19. Ele havia dado entrada no hospital de Pauini, no Amazonas, às 10h40 da manhã do dia anterior (segunda-feira, dia 15 de junho). No hospital, realizou um teste rápido para Covid-19 e o resultado foi positivo. Foi, então, encaminhado para uma sala de isolamento porque apresentava muita falta de ar e se sentia bastante cansado. No dia seguinte, terça-feira, faleceu às 12h30.

Moacir tinha 90 anos e nasceu na colocação São José do Tacaquiri, hoje Terra Indígena Peneri-Tacaquiri. Filho de Raul e Maria, era neto de Antônio Maia e de André, e bisneto de Payanã (Mayõpyry), importantes lideranças e pajés dos tempos antigos. Aos 30 anos de idade, Moacir decidiu vir morar na região de Santa Vitória.  Ainda que todo Vale do Tacaquiri fosse região historicamente reconhecida como indígena, e bravamente defendida por André no passado, a região de Santa Vitória não foi reconhecida no primeiro processo de regularização, ficando de fora do perímetro da Terra Indígena Peneri/Tacaquiri. Apesar da pressão de pessoas de fora para que se mudasse para dentro da Terra Indígena demarcada, Moacir sempre defendeu a sua aldeia em Santa Vitória como terra indígena. Para isso, tinha os argumentos da história da região, que conhecia como ninguém. A área está em processo de regularização.

“Moacir foi uma das minhas famílias quando trabalhei no Purus. Inúmeras vezes ele e Dona Maria, sua esposa, receberam-me. Pessoas doces e amorosas, guardaram minhas coisas, aconselharam-me, contaram histórias de pajés, histórias antigas. Seu Moacir me mostrou os lagos habitados por pajés e os muitos sinais da presença antiga dos Apurinã na área da Santa Vitória.” (Juliana Schiel, antropóloga)

A Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi (OPIAJ), publicou a seu respeito:

“Ele era pajé e leva consigo conhecimento de nossa cultura e tradição. O sentimento que nós temos é que perdemos uma biblioteca de saberes, porém aceitamos a ordem divina de nosso Tsura. Seu ciclo se encerrou e novos ciclos se iniciarão. Nós, enquanto povo e organização, estaremos aqui para dar continuidade na sua e nossa luta.”

FONTES

Foto em Destaque: Juliana Schiel

Fotos na Galeria: Juliana Schiel; Juliana Schiel e Maypatxi (Vanessa A. Souza)

Leitura sugerida: “Tronco Velho: histórias Apurinã” – tese da antropóloga Juliana Schiel.

https://bityli.com/UY9F0 


Texto e fotos enviados pela antropóloga Juliana Schiel e por Maypatxi (Vanessa Apurinã Souza) – Secretária Executiva da Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi (OPIAJ)

Eliezer Tolentino Puruborá, 90

Puruborá

Homenagem escrita por Gilmara Camila Puruborá, sobrinha de Eliezer Tolentino Puruborá

 

Eliezer Tolentino Puruborá faleceu no dia 08 de junho de 2020 na cidade de Guajará-Mirim, Rondônia. O nosso ancião foi acometido pelo novo coronavírus da Covid-19. Infelizmente ele não resistiu à essa nova doença e nos deixou.

Para nós Puruborá é muito triste perder um ente querido. Principalmente quando essa perda acontece com aquelas pessoas que consideramos ser nossas “bibliotecas vivas”, pois as pessoas mais velhas possuem a maior parte dos nossos conhecimentos e da nossa sabedoria ancestral. Para as pessoas jovens como eu, os anciãos são fontes riquíssimas da ciência tradicional. Verdadeira inspiração para dar continuidade à luta que o nosso povo diariamente enfrenta na busca pelos nossos direitos constitucionais.

Eliezer tinha mais de 90 anos de idade. Era um dos últimos anciãos do nosso povo e um dos poucos falantes da língua Puruborá. Ele contribuiu muito para o registro e o resgate da nossa língua e para o mapeamento do nosso território tradicional.  

Eliezer, ainda quando criança, perdeu os pais. Era uma época em que muitas crianças ficaram órfãs em consequência do contágio por doenças trazidas pelos não indígenas (a gripe, o sarampo, a catapora e a caxumba), que dizimaram a maior parte de nosso povo. Nessa época em que perdemos muita gente, muitas crianças foram dadas aos seringueiros pelo encarregado do Serviço de Proteção aos Índios (SPI). Outras crianças passaram a se virar praticamente sozinhas. Viviam e aprendiam com um e outro. Foi nesse período também que fomos proibidos de falar a nossa língua nativa e de fazer quaisquer manifestações culturais e religiosas.

No início da adolescência, Eliezer trabalhava na seringa e colhia poalha no Limoeiro, um lugar que parecia um vilarejo e ficava às margens do rio São Miguel. Lá conheceu Celina, mulher com quem teve uma filha, Regina. O relacionamento não foi adiante e Celina se envolveu com outra pessoa e foi embora.

Em seguida, após tantas restrições impostas pelo Estado e na tentativa de tentar melhores condições de vida e trabalho, Eliezer decidiu sair do território tradicional e buscar oportunidades na cidade. Aceitou uma proposta de trabalho feita pelo então chefe da FUNAI de Guajará-Mirim, o senhor Didimo Graciliano, que também prometeu registrá-lo com o nome de seu povo.

Logo que chegou à cidade, Eliezer reforçou o desejo de ser registrado. Ele queria colocar o nome do povo Puruborá junto ao seu. E assim aconteceu. Os seus documentos foram feitos somente após a sua chegada em Guajará e ainda continha alguns erros, por exemplo, ele era mais velho do que o registro que constava na sua identidade. Em Guajará-Mirim, como não tinha com quem falar a língua, acabou se afinando de falar português.

Durante alguns anos ele trabalhou em uma das fazendas do então chefe da FUNAI, seu Didimo Graciliano, mas adoeceu. Passou um tempo em tratamento no hospital. Não recebeu qualquer visita de Didimo ou outra pessoa. Quando obteve alta, ninguém da fazenda foi buscá-lo. Por essa razão, ele não retornou para trabalhar na fazenda. Foi se virando sozinho para sobreviver na cidade. Até que conheceu Almir Pandurí, que ao vê-lo naquela situação de grande vulnerabilidade lhe ofereceu um serviço.

Eliezer passou a trabalhar e a morar na fazenda de seu Almir. Lá ficou em torno de 15 anos até que novamente adoeceu. Ele tinha sérios problemas pulmonares. Não podendo continuar trabalhando, retornou ao hospital para realizar outro tratamento. Quando melhorou viu-se sozinho mais uma vez e não tinha mais nenhum lugar para onde poderia ir.

Na cidade dependeu da ajuda de muitas pessoas que foi conhecendo com o tempo. Morou em um puxadinho feito nos fundos do quintal de uma senhora que o amparou. Ele retribuía esse gesto conforme podia. Quando a senhora faleceu, os filhos dela deixaram Eliezer continuar morando por lá. Mas, ficou cada vez mais difícil viver sozinho, pois eram muitas as dificuldades ocasionadas pela doença e pela velhice.

Nesta época longe das fazendas ele conseguia receber visitas dos parentes Puruborá que também estavam morando em Guajará-Mirim. Foi quando resolveu sair do puxadinho para morar com a Clarice Puruborá – filha de uma prima já falecida. Clarice lhe deu abrigo e o cuidou. Neste período, uma das netas de Eliezer promoveu a reaproximação entre ele e sua única filha: Regina. Não se viam há muitos anos. Em seguida ao encontro, ele foi morar junto com a filha. Quando Eliezer faleceu com o coronavírus, ainda não tinha completado um ano que moravam juntos.

Após ter ido embora do território onde nasceu, Eliezer e os outros parentes indígenas que viviam na cidade e que agora já eram anciãos, retornaram ao território de origem, para participarem das assembleias anuais do povo Puruborá. Nessas assembléias reivindicavam, sobretudo, o direito à identidade étnica e à demarcação do território tradicional. Era grande o desejo dos anciãos, queriam ver a terra ser demarcada. Eliezer foi mais um Puruborá que faleceu sem ver o território do seu povo demarcado. O que para nós Puruborá é muito triste. Pois foram essas pessoas marcadas pelo contato com o não indígena que tiveram suas vidas modificadas de modo mais brusco. Infelizmente, eles estão partindo. Um a um. Sem que esse sonho seja realizado em vida.

FONTES

Foto em Destaque: Enviada por Gilmara Camila Puruborá, sobrinha de Eliezer Tolentino Puruborá.

Foto na Galeria: Enviada por Gilmara Camila Puruborá, sobrinha de Eliezer Tolentino Puruborá.

Texto escrito por Gilmara Camila Puruborá.

 

 

Alvino Andrade, 59

Macuxi

Alvino Andrade da Silva faleceu em Boa Vista, aos 59 anos, dia 20 de junho de 2010. Mais uma vítima do novo coronavírus entre o povo Macuxi, foi educador e militante ativo no movimento indígena em Roraima. Nasceu na comunidade Boqueirão, região Tabaio, município de Alto Alegre. Era formado em filosofia/teologia pelo Centro de Estudos de Comportamento Humano (CENESC) em Manaus e em Sociologia pela Universidade Federal de Roraima (UFRR). Alvino participou de modo decisivo na formação de muitas outras lideranças e profissionais indígenas, contribuindo para a criação e a realização de ações afirmativas no ensino superior: lecionou na UFRR e na Universidade Estadual de Roraima (UERR); participou da proposta de criação do Instituto de Formação Superior Indígena da UFRR, INSIKIRAN; foi Assessor Especial do Reitor da UERR (de 2015 a 2017). Também coordenou o projeto E’ma Pia, plano base para ingresso de estudantes indígenas de graduação na UFRR, através do Processo Seletivo Específico para Indígenas. Além de tudo isso, participou da elaboração do Programa Território da Cidadania das Terras Indígenas Raposa Serra do Sol e São Marcos.

Sua morte foi lamentada em notas de pesar da Secretaria de Estado do Índio de Roraima (SEI) e do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Em seu perfil no Facebook, Gersem Baniwa escreveu:

“Definitivamente estamos vivendo uma necropolítica – política da morte. Todo dia perdemos parentes, amigos, lideranças, grandes educadores, grandes homens e seres humanos. É uma tragédia humana. Hoje perdemos outro grande educador de Roraima, Alvino Andrade da Silva Macuxi. Fomos colegas na graduação de Filosofia em Manaus. Depois, por um tempo, ele escolheu o caminho religioso, como padre. E depois seguiu a missão de educador, tendo contribuído com a criação do INSIKIRAN na Universidade Federal de Roraima, onde também coordenou, junto com a saudosa professora Maria Luiza Fernandes, o Projeto E’ma Pia, que tinha por objetivo garantir vagas para indígenas nos vários cursos da universidade, como de fato acabou acontecendo. Foi a partir desse projeto que começou a seleção específica para indígenas: PSEI/UFRR.

Que seu exemplo de educador humilde, dedicado, sábio e de muito amor ao próximo seja nossa inspiração e força para continuarmos nossa luta por direitos humanos aqui na terra. Descanse em paz amigo! De junto de nossos ancestrais olhe por nós, interceda por nós! Precisamos de muita luz, amor e fé para continuarmos vivendo, existindo, resistindo. ALVINO MACUXI: PRESENTE, SEMPRE!”

 

O antropólogo Alexandre Goulart, em comentário na nota de pesar postada na página de Facebook do CIR, deixou registrado:

“Alvino Andrade Macuxi foi propositor e aluno brilhante do primeiro curso de formação de gestores de projetos indígenas do PDPI, pelos idos de 2004-05 e liderança à frente de vários projetos de gestão territorial e ambiental das Tis Raposa Serra do Sol e São Marcos. Deixa um legado de compartilhamento de seu conhecimento e aprendizado, de luta contínua pelos direitos dos povos indígenas e de alegria e bom humor junto àqueles que puderam compartilhar de sua companhia. Mais uma perda muito triste.”

FONTES

Foto em Destaque: Reprodução//Facebook

Fotos na Galeria: Reitoria Nossa Senhora Aparecida; Reprodução//Facebook de Selmar Almeida; Reprodução//Facebook; Conselho Indígena de Roraima (CIR); Reprodução//Facebook Gersem Baniwa

 

Reitoria Nossa Senhora Aparecida
https://www.facebook.com/comunidadeaparecidarr/photos/a.572667596556095/856161771540008

Conselho Indígena de Roraima (CIR)
https://www.facebook.com/conselhoindigena.cir/photos/a.733468493439743/733489863437606/?type=3

https://www.facebook.com/conselhoindigena.cir/photos/a.1082038455249410/3008483675938202/?type=3&theater

Plataforma Lattes
http://lattes.cnpq.br/5887655746681370

Gersem Baniwa
https://www.facebook.com/Gersembaniwa/photos/a.209597799771436/675586106505934/?type=3&theater

G1
https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2020/06/21/militante-indigena-que-atuou-na-criacao-do-insikiran-e-demarcacao-da-raposa-serra-do-sol-morre-de-covid-19-em-rr.ghtml

Universidade Federal de Roraima
http://ufrr.br/ultimas-noticias/6385-nota-de-solidariedade-7

 

Colaboração: Leonor Valentino (Antropologia, Museu Nacional – Rio de Janeiro /RJ)

Dace Biorebu, 77

Munduruku

Homenagem escrita po Honésio Dace Munduruku, filho de Dace Biorebu.


Dace Biorebu, como era conhecido por Arcelino Dace Munduruku em língua
portuguesa, foi um dos últimos sábios que carregava no seu acervo mnemônico, séries de conhecimentos de seus ancestrais. Os munduruku de seus contemporâneos eram indivíduos que dominavam conhecimentos de variados aspectos e entendiam por essência tudo sobre a respeito da cosmologia, são pessoas muito ligadas às crendices, nas suas concepções acreditam que o ser humano é reencarnado na figura de animais logo após a morte, esse tipo de crença é o ponto mais forte e dominante à geração do Arcelino.

Os Munduruku dessa geração são considerados últimos sábios, porque eles dominavam como dito, diversos conhecimentos que eram restritos aos mais jovens, eles adquiriram saber devido a forma como foram criados, seus pais os preparavam desde cedo para ter capacidade de aprender conforme aos moldes tradicionais.

A forma de ensinamento dos jovens munduruku daquela época era muito forte aos costumes e tradição dos ancestrais, e todos jovens eram ensinados na “Uksa”, um tipo de casa de guerreiros, onde os ensinamentos eram transmitidos oralmente pelos mais velhos aos mais novos sobre cosmologia, arte, história, e sobre diversos tipos de conhecimentos, “uksa” era o lugar exclusivo para homens, as mulheres eram proibidas a entrar e nem podiam ter acesso sob pena de castigo pelos espíritos da natureza.

Essa base de aprendizagem, que tornava os munduruku primitivos sábios em qualquer tipo de assunto relacionado à cultura, arte, forma de organização, agricultura, caça, pesca, conhecimento sobre remédios tradicionais, xamanismo, crença e assuntos de defesa etc. Assim, os munduruku que antecederam a geração atual eram sábios, mas cada um tinha sua especificidade, como exemplo disso, Arcelino tinha conhecimento sobre diversos temas, como pintura, cântico, instrumentos musicas, histórias, mas sua especialidade era artesanato e como puxador.

De acordo com suposição dos mais velhos, conforme o tempo foi passando, o povo munduruku foi mantendo contato com os “brancos”, e isso influenciou os mais jovens a não terem ligação amigável com a natureza primitiva, e assim estão praticamente perdendo essência e habilidades em resgates daqueles conhecimentos práticos que os mais antigos possuíam, com se não bastasse, ultimamente o povo munduruku está perdendo os valiosos sábios por conta da epidemia que veio assolar de forma desastrosa nas aldeias do Médio Tapajós e no Alto Tapajós, bem como em diversas regiões do Brasil.

Arcelino, nasceu no dia 20 de julho de 1942, na região do Rio Cururu, filho de Timóteo Dace Munduruku e Celina Saw Munduruku, eram uns dos últimos Munduruku que ainda habitavam região de savana, o que em certo período foram atraídos pelos franciscanos a morar às margens dos rios. Como exemplo disso, a aldeia Missão Cururu, inclusive o próprio Arcelino em sua adolescência participara em convento dos Freis que se localizava na aldeia Missão Cururu, o objetivo da assistência do convento era que os jovens munduruku pudessem aprender “boas novas” do evangelho e ainda mesmo que discretamente, eles pudessem adquirir novas culturas até vistas pelos padres como decentes.

Ele pertencente ao clã “esbranquiçado”, linhagem de “Dace” que significa em português “harpia” ou “gavião-real”, espécie de maior águia da Amazônia. Seus pais, segundo seu relato quando ainda em vida, eram Munduruku que não usavam calçados, caçavam com arcos e não falavam português, usavam vestimentas tradicionais.

A saga começou para Arcelino na época em que pele de animais estava no auge entre mercadores e regatões na região da TI Mundurukânia, muitos comerciantes faziam trocas e compras desses produtos com os Munduruku. E de igual forma, extração de borracha e de caucho também estavam movimentando muito os comerciantes aventureiros.

Sua saída da região do Cururu foi motivada por esse advento comercial da época, assim ele teve seus primeiros contatos com outras aldeias localizadas durante a extensão da região do Kaburua e demais regiões da savana. Durante sua juventude ele conheceu Kaba Remug’u͂ m (In memória), que tinha por nome em português Luzia Kaba Munduruku, que era do clã “avermelhado”, que tinha como sub-clã “kaba”, denominação dado à espécie de papagaio. Com ela, Arcelino construiu família e tiveram os primeiros filhos. Nessa época, eles moraram na aldeia Kaburua. Já em meado à década de 70, o mesmo foi morar na aldeia Katon, nessa aldeia tiveram mais filhos totalizando 8 filhos, dentre os quais 5 homens e 3 mulheres.

Ainda na década de 70, Arcelino teve participação indireta na tradução da Bíblia do Novo Testamento em munduruku, denominada de “Deus ekawentup Kawen iisuat”, esse trabalho era da Missão Igreja Batista com apoio de Summer Institute of Linguistics – SIL, ainda atualmente localizada na aldeia Sai-Cinza. Sua colaboração neste trabalho evangelístico foi ajudar a traduzir termos bíblicos a partir do ponto de vista linguístico da língua munduruku.

Arcelino, era “letrado” em língua munduruku, conhecia léxicos, termos, palavreados, sinônimos, metáforas e diversos recursos linguísticos de ângulos diferentes no sentido de pronúncia e de significados. Sua colaboração, era instigar determinados termos bíblicos que tinham sentidos e significados oblíquos, pois para compreensão do munduruku, as palavras têm que ser ditas e pronunciadas de forma precisa para não causar ambiguidade.

No conhecimento de semântica munduruku, ainda que analfabeto, Arcelino era culto, em sua conversa ou quando decidia explicar algo, ele utilizava diversas palavras e frases para explicar o mesmo sentido, sempre tinha atenção em vários ângulos discursivos. Foi devido a esse talento que a Margareth (americana) o chamou para ajudar na tradução indireta da Bíblia do Novo Testamento.

Durante o trabalho, ele estivera em algumas capitais, como Belém e Cuiabá, inclusive, algumas pessoas que gostavam de brincar com ele o apelidaram por isso de “Cuiabá”, isso porque em todos seus relatos o mesmo costumava falar sobre sua viagem em Cuiabá. Em um dos relatos marcantes do mesmo, que segundo ele, na feira de Cuiabá o mesmo conheceu grupo de pessoas que tinham papo igual algumas aves, ele comparava essas pessoas com arara que também tem papo, ao invés de ter estômago.

Na década de 90, Arcelino foi um dos grandes garimpeiros que movimentou a região de Katon, muitos de seus conterrâneos e de outras regiões trabalharam com ele numa espécie de garimpo que era feito manualmente. Houve muita correria, vindas de pessoas de outros lugares em busca de ouro. O mesmo, era conhecido como explorador exímio de garimpo, havia época, principalmente após o período de broca e plantação de roça, ele saía em busca de encontrar garimpo, geralmente, quando encontrava, distribuía entre pessoas que o procuravam, isso sem exigir porcentagem.

Mas, o mesmo não levou adiante esse dom, segundo ele, isso não trazia beneficio para ele e para sua família, apesar de que havia muita gente trabalhando à sua custa, e decidiu parar, visando cuidar de sua família conforme tradição munduruku.

Desde a sua juventude, ele foi homem trabalhador, sua principal atividade era roça para suprir a família, plantava muito maniva, macaxeira, cana-de-açúcar, cará, cará-açu, batata, variadas espécies de bananas. Por onde passava, costumava plantar diversas espécies de plantas, como laranjeiras, abacateiro, cacau, açaí, manga, lima, gostava de plantar fruteiros de espécies raras e bem como remédios tradicionais.

Também foi, um dos grandes caçadores, mas diferente de seus pais, o mesmo usava espingardas, era exímio atirador com rifle 22 e cartucheira 28. Gostava de caçar pacas à noite de canoa, andava com sua inseparável esposa, ela era seu piloto na polpa da canoa. De dia caçava macacos, araras e demais caças maiores, apesar de que viveu na região escassa de caças. Ele costumava curar cachorro para ser bons caçadores de cotias e pacas, e adorava caçar com cão de dia. Conhecia como ninguém a floresta, o mato, veredas, riachos e espécies de plantas silvestres, inclusive, costumava coletar frutos silvestres.

Arcelino, sabia como pegar peixe, ao menos para alimentar a família, num lugar onde os peixes eram muito escassos. Pescava de caniço, com linha e até mesmo com tradicional uso de timbó, seu principal pescado eram aqueles peixes lisos, como mandí, mandubé, surubin, porque para ele esses peixes não tinham espinhas e assim eram alimentos apropriados para crianças. Era homem incansável, de dia trabalhava na roça, ao entardecer saía para pescar com a companhia de sua esposa. Sabia prover a necessidade, quando acabava açúcar, fazia café com garapa de cana-de-açúcar, não demonstrava moleza, mas era espécie de homem e pai tradicional à moda de seus ancestrais, rígido e exigente.

Certa vez, quando ainda tinha uns trinta anos de idade, ele quase perde um filho que ficou doente por dismitidura, inflamação de junta devido à queda. Na época, o mesmo estava num lugar que não tinha pessoas, por isso, não tinha como procurar puxadores conhecidos da época. Então, de acordo com seu relato, ele ficou desesperado ao vero estado em que seu filho se encontrava.

Assim, ao dormir, teve uma visão por meio de sonho, no qual o calango veio até ele para pedir que ele puxasse o filhote que estava morrendo de dismitidura, segundo Arcelino, ele aceitou e puxou, e logo o filhote de calango ficou sarado, então, o calango falou para o mesmo que ele era um bom puxador e lhe agradeceu. Quando acordou, segundo ele, teve ideia de puxar o filho doente lembrando o que o calango havia lhe dito num sonho, e aconteceu que deu certo, o filho moribundo ficou sarado.

Desde então, ele passou a acreditar em sonhos, Arcelino como seus ancestrais, era homem que levava a sério todos os seus sonhos, para ele, todos os sonhos tem significados, eles premeditam algo ruim e algo bom. Por isso, qualquer atividade que requer cuidado como caça, pesca, precisa ser planejada, qualquer andança no mato, precisa de cuidados redobrados, porque lá há cobras, animais peçonhentos e tocos de pequenas plantas que podem machucar.

Caso sonhar algo negativo, que premedita algo ruim, Arcelino costumava fazer um tipo de ritual ou tipo de “cura”, espécie de oração conhecidos tradicionalmente. Para desviar a cobrar, ele costumava pegar lenha acesa e passar entre as pernas, que segundo ele isso desvia a cobra do seu caminho, às vezes, ele fazia passar por entre a corda de arco que também tem efeito semelhante.

Ele era o grande conhecedor de plantas medicinais, na época não havia praticamente o acesso aos medicamentos da medicina ocidental. Então, muitas doenças comuns eram tratadas com medicamentos tradicionais, tais como gripe, diarreia, coceiras, febre, inflamação e entre outras. E da mesma forma, ele conhecia muito bem, os remédios que servia para tratar diversos tipos de problemas patológicos em crianças, como hemorroida e outras.

Sabia, fazer tratamento para crianças que tinham dificuldades em aprender a falar e andar. É comum entre munduruku a crença de que há certos alimentos que não podem ser consumidos pelos pais enquanto a criança é recém-nascida, ela pode ocorrer anomalia fisicamente ou tornar-se doente para esse tipo de problema, ele tinha conhecimento de plantas medicinais de origem vegetal e animal para tratar.

Para ele, ao redor da gente, há inúmeras criaturas malignas que podem machucar as pessoas ou até mesmo matar, segundo ele, o boto é a pior espécie de animais que tem poder sobrenatural, quando em transe ele se transforma em criatura maligna, tem semelhança entre “joropari”, criatura maligna invisível a olho nu, esse pode matar qualquer pessoa quando se cruzar num caminho, que geralmente anda nas altas horas da noite, geralmente seu ataque é fatal.

Há também, segundo Arcelino, criatura sobrenatural “axik”, espécie de espírito de criança, que costuma matar somente crianças, e por isso, há algum tipo de “remédio” de prevenção. Arcelino era exímio artesão, fazia pulseiras e colares com madeiras brutas, coco de tucumã e osso de boi. Dentre as artes, ele fazia por vezes, uma espécie de miniatura de boneco com certo tipo de madeira específica, esse era de utilidade para criança, o qual, segundo ele, podia desviar atenção de “axik” que é atraída pela criança. Por isso segundo recomendava “não ande com criança de noite no meio do caminho e nem fique passeando nas casas alheias”.

Ele não era pajé, e sim era puxador, que aos poucos foi se aprimorando até ser reconhecido como melhor puxador no Alto Tapajós. De acordo com ele, aos poucos foi perdendo habilidade devido à inveja de outros, que inclusive jogaram “kawxi” no seu braço para prejudicá-lo, deixando-o sem força. Assim, com tempo ficou sem força para puxar adultos. Mas mesmo assim, logo após desse episódio ele se tornou um grande puxador de crianças, o mesmo ajudou muitas crianças e adultos doentes a se curarem de traumas e de dismitiduras. Seu desejo era que um dos filhos aprendesse também a puxar, dentre os oito filhos, apenas um demonstrou afinidade, no caso uma filha chamada Eliana.

Na questão de conhecimento de história e lutas épicas do povo munduruku, guerras e conflitos entre outros indígenas, ele tinha um grande acervo, que é inacreditável, podia passar uma noite contando histórias, não acabava seu repertório. Conhecia muitas palavras antigas que geração de hoje não reconhece. Sabia e reconhecia vários alimentos e iguarias dos tempos remotos. Sabia contar seu sonho por detalhes no dia seguinte, isso porque, segundo ele, não bebia água do fundo do igarapé, ele respeitava tudo que seus pais o aconselhava.

Todos os filhos cresceram “curados” com tipo de remédio tradicional, porque seu desejo maior era de que eles fossem alguém na vida, nos estudos, ele queria muito que seus filhos aprendessem a falar português e saber de algo importante, segundo sua visão. Ele queria que alguém aprendesse a tocar instrumento, e assim comprou uma vez um violão, pois desejava que seu filho se tornasse um músico.

Arcelino saiu da aldeia Katon no final do primeiro semestre de 1996. Isso, porque sua esposa havia sido diagnosticada com tuberculose e precisava urgente de tratamento e, naquela ocasião, o município de Jacareacanga não tinha suporte para esse tipo de tratamento. Assim ele ficou algum tempo em Sai-Cinza, onde no primeiro momento recorreu aos pajés, conforme agravação do caso, foi para Jacareacanga e de lá decidiu de vez ir para cidade de Itaituba-PA. Vendeu sua espingarda calibre 22 que tinha para custear sua passagem, assim, em 1999, ele chegou em Itaituba, onde passou alguns dias morando no bairro da Liberdade na casa da parente de sua esposa, a saudosa Iporo Buyat’um, e logo após indo para Pimental onde na época morava sua filha Diana.

Como na comunidade de Pimental não tinha lugar suficiente para seu plantio, ele resolveu morar por um tempo numa comunidade chamada de Parana Mirin, no sítio da saudosa Iporo Buyat’um passou quase um ano, e como não deu certo também, em 2001, ele procurou lugar na aldeia Praia do Mangue, onde morava seu cunhado João Kaba. Passado alguns dias, Amancio Ikon (in memoria) concedeu lugar para ele morar na aldeia Praia do Mangue. Então, o mesmo começou a fazer roça, que logo mais tarde tornaria um espaço onde seus familiares logo depois da chegada também vieram para morar.

No inicio, Arcelino plantou inúmeros pés de plantas, mas a maioria não deu certo, só ficaram as plantas comuns. Construiu lar, os filhos cresceram, casaram-se, e aumentaram os netos, e hoje o pequeno espaço que fica na aldeia Praia do Mangue, tem o suor e o trabalho do homem humilde e trabalhador.

Logo que as pessoas começaram a ter conhecimento a respeito dele no Médio Tapajós, ele ficou conhecido e reconhecido como um dos melhores puxadores e artesão. Ele ajudou muita gente, quando ainda estava sadio no sentido de saúde, muitas pessoas o procuravam, tanto indígenas, quanto brancos, pessoas dismitidas, pernas, costas, braços machucados ou das vezes quebrados. E da mesma forma, ele era muito procurado pelos turistas devido a seu artesanato, Arcelino fazia pulseiras e colares muito lindos, e isso fez com que ele ficasse conhecido no Médio Tapajós.

Ele foi homem bastante trabalhador, só parou de trabalhar na roça logo que sua esposa faleceu em 2017. No início de maio, ele iniciou complicações do problema de saúde, que era cálculo biliar, conhecido como pedra na vesícula, durante crises foi levado para emergência do hospital de Itaituba-PA três vezes, provavelmente durante essas idas, o mesmo foi infectado pelo covid-19, inclusive, antes do seu falecimento testou positivo para Covid-19.

Arcelino Dace Munduruku, faleceu no dia 03 de junho de 2020 pela manhã, levando o legado adquirido durante sua trajetória em vida que ninguém e nem seus filhos herdaram. Mas, o seu legado deixado é o exemplo de homem humilde, trabalhador e honesto, e isso pelo menos são qualidades mais fáceis que serão lembradas eternamente.

FONTES

Foto em Destaque: Honésio Dace Munduruku 

Fotos da Galeria: Honésio Dace Munduruku 

 

Mediação: Luciana França (Antropologia, UFOPA – Santarém/ PA)

Aurelia Jifichiu Kumemarima, 71

Bora

Homenagem escrita por Maria Luísa Lucas, Pós-doc DRE / Musée du quai Branly – Jacques Chirac; LARMe – Museu Nacional / UFRJ

 

Aurelia Jifichiu nasceu em 1948 e faleceu, aos 71 anos, no dia 28 de junho de 2020 vítima da Covid-19 e também do descaso dos governos com os povos indígenas na tríplice fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru, no alto Amazonas.

Aurelia era uma mulher Bora cuja história não deve ser esquecida. A maioria de seus ancestrais foram brutalmente mortos no começo do século XX por funcionários da Casa Arana, empresa de borracha que promoveu e financiou um dos etnocídios mais bárbaros de nossos tempos. Seu avô paterno, chefe do clã Tamanduá, foi um dos poucos sobreviventes. Escapando e se escondendo nas áreas de terra firme do rio Cahuinari, na Colômbia, ele foi fundamental para que outros chefes pudessem reconstruir suas malocas, suas roças, suas famílias e seus rituais.

Aurelia, nascida nesse mesmo rio, tornou-se órfã muito cedo. Ainda nova casou-se com um homem Muinane, com quem teve diversos filhos. Aurelia era uma mulher doce e de riso fácil. Era possível encontrá-la todos os sábados na praça da cidade de Leticia vendendo beiju e o que mais conseguisse cultivar em sua roça. Fazia visitas regulares ao aterro sanitário da cidade e orgulhava-se de encontrar verdadeiros tesouros em meio ao que os brancos descartavam. Acolhedora, convidava todos a visitar sua maloca. No km 18 do ramal que um dia foi planejado para ligar Leticia a Tarapacá (um dos muitos povoados da Amazônia Colombiana hoje esquecidos pelas autoridades), há uma placa que diz “Maloca Bora”. Meia hora de caminhada mata adentro, a beira de um pequeno córrego, Aurelia mantinha um ritmo de vida idêntico àquele de seus parentes nos territórios mais distantes. Há muitos anos separou-se de seu antigo companheiro, Aniceto, que morreu de Covid-19 há poucos dias e também é homenageado pelo site do Memorial Vagalumes. Aurelia ajudou na criação de muitos de seus netos, bisnetos e sobrinhos e sempre se orgulhava de ser uma mulher forte e independente. Assim ela será sempre lembrada.

 

“Palabras de un abuelo”, por Abuelo Raúl Yucuna

(Muinane-Bora) – via Gory Hernando Negedeka Jifichiu.

 

“Ellos se fueron
Pero dejaron rastros,
Ellos se fueron cantando
Pero dejaron el eco,
Ellos gritaban y regañaban
Pero dejaron sus enseñanzas..
Ellos están allá escuchándonos
Ellos no están muertos ellos están allá
y desde allá nos seguirán iluminandonos
para que la palabra de vida no muera,
esa palabra ahora está con sus nietos(as).”

 

Palabras escritas por Gory Hernando Negedeka Jifichiu

 

Gracias mis grandes maestros, me han dejado en este mundo con una tarea….buen viaje Padre y Madre….sus palabras está vivas y seguiremos siendo guardianes de la sabiduría.

Madre, adiós prometo seguir el trabajo que me dejaste, para alegrarte allá, cómo cuando me viste por primera vez en este mundo, acompáñame madre cada segundo de mí vida, como hiciste acá.

 

Palabras escritas por Luzma Negdk

 

Madre te fuiste al cielo cerrando tus ojitos de este mundo, por que eres un ángel de amor y bondad que nunca morirá!! Madre acompañanos aca unos de tus hijos dandonos fuerza y mucha fortalezas para seguir ese camino que nos enseñaste.

 

Palabras escritas por Patrícia Suárez

 

Y duele mucho, se hace un nudo en la garganta cada vez que alguien me llama o me escribe y me dice “se nos fue” y yo vuelvo al mismo lugar una silla que me ha sostenido por estos días en el centro de Bogotá, en donde me senté y lloré por primera vez la partida de mi hermano Camilo, después la de Yamil, la de mi amiga Edirley, la de los abuelo Aniceto, Aurelio y hoy la abuela Aurelia y me hago la misma pregunta ¿Por qué? Creo que mi pregunta nunca será respondida y que ninguna repuesta llenara los vacíos que van dejando. Se han ido unos grandes abriéndonos caminos, dejaron en nosotros lo mejor de cada uno, ahora nos toca a nosotros hacer amanecer sus palabras.

 

Homenaje de Edinho Bautista Florez

 

Hoy lamento tristemente tu partida Abuelita Aurelia. Te vas dejando tú huella en cada persona que tuvo la dicha de conocerte y compartir una sonrisa en cada encuentro en la maloca, en la chagra y en la selva. Dejas tus enseñanzas a tus hijos y nietos como una de las guardianas del conocimiento ancestral. Q.E.P.D

Buen viaje espiritual…

Todas as homenagens em espanhol foram autorizadas pelas pessoas que escreveram.

FONTES

Foto em Destaque: Edinho Bautista Florez

Fotos da Galeria: Edinho Bautista Florez; Edinho Bautista Florez; La TropiKitchen; La TropiKitchen; Bixina y Cafeína; Reprodução//Facebook de Lina Maria Payeu Lopez; Reprodução//Facebook de Lina Maria Payeu Lopez; Reprodução//Facebook de Lina Maria Payeu Lopez.

Edinho Bautista Florez
https://www.facebook.com/photo/?fbid=10222846828703190&set=a.4509142090558 

https://www.facebook.com/photo?fbid=10222846922825543&set=a.4509142090558

Bixina y Cafeína
https://www.facebook.com/bixinaycafeina/photos/a.173497240864493/173497224197828/

La TropiKitchen
https://www.facebook.com/latropikitchen/posts/709183816292632

Livro escrito também por dona Aurelia
https://lalenguaesespiritu.files.wordpress.com/2018/03/lengua-viva-bora-libro-digital-isbn-978-958-46-8297-0-ii.pdf

“Cumari: uma jornada culinária para salvar a Amazônia”, Aurelia é uma de “las abuelas” entrevistada neste vídeo.
https://vimeo.com/208216019

 

Homenagem em português escrita por Maria Luísa Lucas, Pós-doc DRE / Musée du quai Branly – Jacques Chirac; LARMe – Museu Nacional / UFRJ.